terça-feira, 25 de setembro de 2007


 
A difícil tarefa de demitir
No mundo corporativo, se há um momento crucial em que discurso e prática são postos à prova, sem dúvida é o que envolve o rompimento do contrato de trabalho. Nesta hora, os valores apregoados por uma organização ficam em xeque, desnudando o verdadeiro jeito de ser da companhia. Para as que alinham os preceitos às atitudes, cria-se uma oportunidade interessante: a de demonstrar a quem está saindo - e também aos que permanecem - que o jogo pode até mudar de direção, mas que o respeito ao ser humano e a valorização das pessoas como principal ativo da empresa falam mais alto.
As demissões estão mais freqüentes do que nunca, por várias razões. A competitividade do cenário global traz mudanças muito intensas e, não raro, de grande impacto. Movimentos de fusão e aquisição, redirecionamento dos negócios, demanda por novas competências, tudo isso influencia enormemente o cotidiano das empresas e de seus colaboradores, com o agravante de que os profissionais agora têm de lidar com uma realidade de ciclos cada vez menores, exigências inversamente maiores e até novas formas de contratação, bem mais flexíveis do que as de um passado nem tão distante.
O meio ambiente mudou, e permanece em constante e rápida mutação. Ainda que a demissão tenha se tornado mais freqüente, demitir continua sendo uma tarefa muito complexa, para a qual a grande maioria dos gestores de pessoas está totalmente despreparada. Executivos de Recursos Humanos, por exemplo, surpreendem-se quando eles mesmos enfrentam o desligamento. Ao sentirem na própria pele o sofrimento da ruptura, conseguem então fazer uma releitura das práticas que ajudaram a implementar em suas empresas e, nesse momento, compreendem com maior profundidade o alcance de um suporte profissional como o outplacement.
Sem medo de exagerar, é possível dizer que o mercado não dispõe ainda de total clareza quanto à dimensão do outplacement, seus objetivos e características. Tanto que ainda se percebe uma confusão entre serviços de recolocação profissional contratados por pessoa física, área em que atuam desde consultorias das mais sérias até verdadeiros caça-níqueis, e o outplacement, serviço patrocinado pelo ex-empregador e que não apóia apenas o demitido, mas dá suporte à companhia e aos envolvidos diretamente na condução do processo de desligamento.
Trata-se de uma solução que possibilita lidar com a ruptura de forma mais ampla, amenizando seus impactos em diferentes instâncias. Do ponto de vista do demitido, é um amparo inestimável para que ele possa se recompor e planejar a continuidade da carreira. Para a empresa, significa um eficiente mecanismo que possibilita manter o moral dos remanescentes, reafirmar valores e preservar a imagem interna e externa.
Nem todos se dão conta, porém o outplacement tem grande importância no processo de atração e retenção de talentos. A certeza de um tratamento digno e respeitoso quando do término do contrato de trabalho pesa na decisão de atuar (ou permanecer) em determinada organização. O aprendizado de que a carreira é um patrimônio a ser gerido com competência e apuro ampliou a consciência dos profissionais quanto ao seu verdadeiro papel nos processos seletivos. Se antes a escolha era prerrogativa do contratante, hoje a seleção passa por uma via de mão dupla, com as companhias também sendo eleitas pelos candidatos — e é nessa hora que a conduta corporativa em momentos críticos como a demissão adquire relevância ainda maior.
O outplacement profissionaliza e humaniza as relações de trabalho. Ele não se limita ao momento de comunicação da dispensa ou ao acolhimento do demitido e posterior suporte. Ao contrário, sua eficácia se amplia sempre que a solução está presente desde a tomada de decisão pela dispensa do executivo ou até mesmo antes disso, quando é possível avaliar se a demissão representa, de fato, o caminho mais indicado.
Como, quando, onde e por quem será realizada a comunicação faz enorme diferença e dá o tom da qualidade do relacionamento pós-desfecho. Vale sempre lembrar que, em diferentes momentos da vida, desempenhamos variados papéis, influenciando o entorno. Um colaborador que, mesmo demitido, tem boas referências do ex-empregador traz enormes dividendos para a companhia. Indiscutivelmente, não há melhor cartão de visitas do que esse.
Se desempenhar o papel de agente na demissão do outro já é difícil, o que dizer sobre ser o objeto do desligamento? Inúmeras pesquisas já constataram que perder o emprego está entre os mais estressantes episódios da vida, superado apenas pela experiência da morte de um ente querido e pela separação conjugal. No entanto, é possível enfrentar a demissão de forma produtiva, encarando o período como uma parada técnica, tanto do ponto de vista pessoal quanto profissional.
Gazeta Mercantil, Vida Executiva, José Augusto, 24/09/2007

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